Migrar ou morrer, o dilema dos pacientes com esclerose múltipla na Venezuela
"Você tem esclerose múltipla" e "na Venezuela não estão disponíveis os medicamentos de que você precisa". O diagnóstico dos médicos caiu como uma sentença para Jaimar Tuárez, que procura no exterior alternativas para salvar sua vida.
Sem recursos para cobrir exames, incluindo uma punção lombar de 800 dólares (3987 reais), esta estudante de psicologia de 22 anos iniciou campanhas na plataforma de arrecadação GoFundMe para tratar a doença, que segundo números extraoficiais afeta cerca de 2.000 pacientes neste país.
"Para muitas pessoas, a opção é emigrar", diz à AFP do seu apartamento em Charallave, a 50 km de Caracas, segurando uma radiografia.
Devido à agressividade de sua última recaída, que praticamente a impedia de ficar de pé, ela abandonou os estudos e o trabalho, complicando ainda mais a economia familiar. Ela depende junto com sua mãe, sobrevivente de um acidente vascular cerebral, de sua avó, uma manicure de 72 anos que trabalha em um salão de beleza.
A esclerose múltipla (EM), sem cura, resulta de um ataque do sistema imunológico que causa múltiplos sintomas cognitivos, de visão e de mobilidade. As manifestações da chamada "doença das mil faces" podem aparecer e desaparecer entre "surtos".
"Tenho que sair daqui, porque quais são as minhas opções? No próximo surto o que vai acontecer? Vou ficar sem falar? Tenho 22 anos, espero o próximo surto aqui? O que vai acontecer com todos os meus sonhos, com meus planos?", questiona entre lágrimas.
Seu caso dá rosto às limitações enfrentadas por todos os pacientes crônicos na Venezuela, agravadas na última década. Há mais disponibilidade de medicamentos para outras doenças como o câncer, embora sempre sem garantias.
- Medidas cautelares não cumpridas -
Entre 2019 e 2021, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) aprovou medidas cautelares em favor de venezuelanos com EM para solicitar tratamentos ao governo venezuelano, que não reconhece a entidade.
A situação "é grave, estamos à deriva", lamenta María Eugenia Monagas, de 57 anos, que caminha apoiada em um andador.
Ela explica que o estatal Instituto Venezuelano de Seguro Social (IVSS), responsável por fornecer tratamentos a pacientes crônicos, apresenta falhas desde 2016. Retomou o fornecimento aos poucos em 2020 através de medicamentos genéricos, alguns "sem registro sanitário", destaca.
"Muitos chegaram à incapacidade ou à morte por falta de medicamentos", afirma Monagas, que mantém os "surtos" sob controle graças a um tratamento pago por seus dois filhos, um fora do país, e seu marido.
Andrés Marcano, tradutor de 53 anos residente em Caracas e diagnosticado há duas décadas, ficou paralisado há cinco anos pela falta de tratamento.
"Tenho dificuldade para falar, não caminho, estou impossibilitado de ficar de pé e, por consequência, me desloco em uma cadeira de rodas. Trabalho sentado e às vezes sinto fraqueza", descreve.
"Alguns pacientes recém-diagnosticados recebem genéricos trazidos da Índia, mas nós, que estão em estágios avançados, precisamos de medicamentos mais potentes que não chegam", explica Marcano à AFP por WhatsApp.
O governo do presidente Nicolás Maduro atribui as falhas às sanções dos Estados Unidos, uma tese que contrasta com denúncias que envolvem ex-funcionários do ministério da Saúde e do IVSS em fraudes milionárias.
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